“Barbie”: o que esperar do filme com base no que já sabemos – e o que ainda pode surpreender

Por: Lucas Bruno Sales

O segundo teaser trailer do filme Barbie foi divulgado nesta terça-feira (04), junto com vários pôsteres anunciando um elenco de peso — além dos protagonistas Margot Robbie e Ryan Gosling como Barbie e Ken, nomes como Dua Lipa, Michael Cera, Helen Mirren e Will Ferrell também foram confirmados. Mas, apesar das grandes expectativas por parte do público, muito sobre o longa ainda está mantido sob segredo. Com estreia confirmada para 21 de julho nos Estados Unidos, essa é a primeira vez que a boneca mais famosa do mundo, lançada em 1959, vai para as telonas em estilo live-action, e o mistério acerca do roteiro do filme parece ser uma peça fundamental da campanha de divulgação que a Warner Bros Pictures vem fazendo.

A sinopse oficial não oferece muitos detalhes: no mundo mágico de “Barbieland”, todas as versões da Barbie vivem em harmonia e sem preocupações. Mas uma delas (Robbie) começa a perceber que não se encaixa como as outras. Após ser expulsa devido às suas imperfeições, Barbie e seu namorado Ken (Gosling) vão para o mundo real e precisam lidar com uma série de dificuldades, o que leva Barbie a descobrir que a beleza está no interior de cada um. Os dois teasers já divulgados focam principalmente em deslumbrar o espectador com uma sequência de cenas que não formam nenhuma história, mas encantam com suas cores vibrantes, cenários elaborados que lembram as clássicas casinhas de boneca, trilha-sonora divertida e poucos diálogos em tom de comédia escrachada. Em linhas gerais, parece uma história leve e descontraída, mas previsível e repleta de clichês. O que não seria uma surpresa, dado que o histórico da boneca no mundo real é muito ligado às ideias de infância, adolescência e família. Contudo, há indícios de que a diretora Greta Gerwig — que também é roteirista do filme, junto com o seu companheiro e colaborador de longa data, o também cineasta Noah Baumbach — tem algumas cartas na manga.

A primeira pista se deu em maio deste ano, quando fãs encontraram uma lista na plataforma Letterboxd — uma rede social dedicada ao cinema, onde os usuários podem opinar sobre filmes e criar listas personalizadas — que supostamente pertenceria à atriz Margot Robbie. Criada por um perfil sem foto e utilizando um apelido e o sobrenome de casada da estrela, a lista se chamava “Assistir para Barbie” e continha títulos como Splash (1984), um filme sobre uma sereia que resgata um humano e vai procurá-lo em Nova Iorque, e os dois vivem um romance enquanto fogem de pesquisadores que querem fazer a sereia de cobaia, e “O Show de Truman” (1998), sobre um homem que não sabe que sua vida é uma realidade simulada em um programa de televisão, transmitido 24h por dia para milhões de pessoas ao redor do mundo. Essas referências, unidas a declarações como a do ator Simu Liu, confirmado no projeto, de que o roteiro de Barbie era um dos mais impressionantes que ele já lera na vida, levaram os fãs a teorizar sobre o longa, deduzindo que ele poderia ter um tom mais complexo do que o esperado e lidar com temas mais maduros, como objetificação das mulheres, rompimento de padrões e manipulação da mídia. A suposta conta secreta de Robbie foi deletada da plataforma logo depois.

Então veio o primeiro teaser, diretamente inspirado em “2001: Uma Odisséia no Espaço” (1968), de Stanley Kubrick, diretor de clássicos como “Laranja Mecânica” (1971) e “O Iluminado” (1980). O filme de Kubrick lida com questões como evolução, existencialismo e inteligência artificial, e na sua cena de abertura apresenta um grupo de primatas no período pré-histórico que, em meio a um conflito, são surpreendidos pela aparição de um monólito. O teaser faz uma releitura dessa icônica cena, substituindo os primatas por garotinhas que brincam com bonecas de pano e porcelana, e o surgimento da Barbie — em escala gigantesca, usando uma réplica do figurino da primeira edição da boneca — é o que muda tudo, levando as meninas a destruírem suas antigas bonecas.

Essa homenagem não é por acaso: assim como o monólito de Kubrick representa o início de um novo período temporal para a humanidade e o choque que vem com a necessidade de adaptação, a Barbie foi a primeira boneca que fugiu dos padrões do segmento. Se antes as garotinhas não tinham escolha a não ser brincar com bonecas que eram, elas próprias, bebês — um costume que intencionalmente nutria nelas um senso de maternidade e proteção — com a Barbie elas passaram a compreender as implicações de ser mulher na vida real, fora da bolha tradicionalista que as enxergava apenas como figuras coadjuvantes e submissas. Brincar com uma boneca que era a representação ideal de uma mulher madura, moderna e independente, que era admirada não apenas pela beleza, mas também podia ter inúmeras conquistas em qualquer carreira que escolhesse, mudou para sempre a relação das garotas com a sua própria imagem, assim como a compreensão do seu papel na sociedade. Claro, isso também colaborou com a propagação de padrões — estéticos e intelectuais — muitas vezes inalcançáveis, levando a inúmeros problemas que meninas enfrentam até hoje em relação a seus corpos e potenciais, mas essa dualidade pode ser justamente um dos temas que o filme está mais interessado em explorar.

Com o novo teaser, vemos um pouco mais dessas intenções, ainda que disfarçadas de arquétipos: nessa versão, várias atrizes interpretam encarnações da Barbie, passando por diferentes aspirações e conquistas (temos uma Barbie presidente, outra diplomata, outra vencedora do Nobel de física, etc.) etnias, tipos de corpo e até mesmo identidades de gênero (a atriz Hari Nef, uma das intérpretes da Barbie, é transexual). O uso de um multiverso pode parecer um recurso narrativo saturado hoje em dia, mas Gerwig não é conhecida por fazer trabalhos rasos e superficiais. Os dois outros filmes comandados por ela — o coming of age “Lady Bird: A Hora de Voar” (2017) e o drama histórico “Adoráveis Mulheres” (2019) — são obras que exploram diversas camadas da fase de amadurecimento de garotas para mulheres, e lhe renderam aclamação do público e da crítica especializada, além de duas indicações ao Oscar. É difícil acreditar que ela irá perder a oportunidade de fazer uma grande comoção com essa próxima adição à sua filmografia, utilizando a metalinguagem para tecer comentários não tão sutis sobre a importância da Barbie, para o bem e para o mal, nas causas feministas contemporâneas. Isso, claro, sem perder o bom-humor, charme e carisma que fazem da personagem a figura eternizada que ela é. Essa junção de futilidade e crítica, ingenuidade e maturidade, parece ser o grande truque de mestre do filme, uma chance de se destacar frente às expectativas e deixar um impacto à altura do deixado pela boneca da Mattel no universo feminino e na sociedade em geral.

“Barbie” chega aos cinemas brasileiros em julho, e, seja ele uma comédia pastelão para assistir em família ou uma grande cartola cheia de surpresas, com certeza vale a pena conferir em grande estilo.

Veja o trailer abaixo:

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